No mês de junho foi aprovada na ALESP a lei que autoriza a concessão de 13 Parques Estaduais administrados pela Fundação Florestal.
Por mais que este CRF tenha buscado pouco se posicionar sobre o assunto, que era considerado irrefreável no Legislativo, após diversas manifestações, reportagens e entrevistas sobre o tema, optamos por esclarecer alguns pontos.
1) Apesar de parecer óbvia a impossibilidade de exploração florestal no interior de Unidades de Conservação (UCs) de proteção integral, a lei equivoca-se ao tratar da mesma forma os dois assuntos distintos que são os serviços de ecoturismo e a exploração florestal;
2) A relação das unidades de conservação passíveis de concessão causa estranheza. Sua lista apresenta áreas que não são UCs propriamente ditas, como PESM (núcleo São Paulo) e Caminho do Mar;
3) Se é verdade que hoje a capacidade de atendimento ao visitante nas áreas protegidas do Estado é deficiente, é preciso esclarecer que trata-se de condição criada pelos sucessivos atos de sucateamento das instituições que fazem gestão das UCs pelas consecutivas ações do governo estadual. Não tem sido por falta de alerta, já que constantemente este Conselho tem enviado cartas à Diretoria Executiva da FFF, e publicado estudos/ documentos sobre o reduzido quadro de funcionários e a precariedade das condições de trabalho, que tornam nossas Ucs cada dia mais vulneráveis às ações de degradação ambiental. Para relembrarmos um aspecto desse problema, hoje (14/06/2016), a Fundação Florestal, responsável pela gestão de 94 UCs, que abrangem cerca de 18% do território paulista, possui apenas 55 guardas-parques. Pode parecer brincadeira, mas a figura desse funcionário tem um simbolismo forte, sendo destacada em todo o mundo como um importante ator na gestão de Áreas Protegidas. No entanto, no estado mais rico do país, este profissional qualificado tem sofrido constrangimentos diariamente, com retrocessos, inclusive salariais (atualmente o responsável por fiscalizar caçadores, palmiteiros, orientar visitantes etc. recebe o ínfimo salário de R$880,00- menor que o salário mínimo paulista).
4) Outro aspecto que merece destaque em relação às concessões é a visão limitada de que sua aprovação resolverá os gargalos da gestão das UCs. Se por um lado as concessões parecem significar um avanço, contrariamente tendem a ser ineficazes na medida em que veem desacompanhadas de outras ações articuladas -administrativas, técnicas e políticas. Se é verdade que precisamos adequar as condições dos serviços de ecoturismo, é também realidade o dever do Estado em assumir sua obrigação constitucional em garantir as condições adequadas para que as UCs cumpram seus objetivos ecológicos e sociais de conservação da sociobiodiversidade. De acordo com dados obtidos, no ano de 2014, as unidades de conservação PE Cantareira e PE do Jaraguá receberam 150 mil e 600 mil visitantes, respectivamente. Certamente, os maiores percentuais de visitantes controlados no Estado. Esses números são irrisórios quando estamos na maior metrópole da América Latina, com mais de 22 milhões de habitantes, que ainda recebe um grande volume de turistas nacionais e estrangeiros. Essas Ucs poderiam ser os polos difusores de informações para as demais unidades do Estado, aumentando o percentual de visitantes em alguns milhares - por exemplo, os cerca de 30 mil visitantes do PE Caverna do Diabo.
5) Frequentemente ouvem-se comparações entre parques paulistas, brasileiros em outros países, especialmente os EUA. Se, por um lado, é verdade que as concessões funcionam em outros países, por outro lado é necessário constatar que nesses exemplos o Estado cumpre e exerce sua obrigação fundamental na gestão das Áreas Protegidas, disponibilizando funcionários capacitados e condições de segurança adequadas aos seus visitantes. Além disso, se hoje existe uma cultura de visitação às áreas protegidas em diversos países, ela é resultante de um compromisso, permanente, contínuo, na construção dessa cultura.
6) Ao mesmo tempo, deve-se ter em mente que as concessões não podem ser vistas como uma estratégia de desoneração do Estado. Isso porque os benefícios e os serviços que o meio ambiente protegido oferece à sociedade são inúmeros e expressivos. Para citar um dos mais significativos: 60% da agua captada para abastecimento público no Estado de São Paulo depende, direta ou indiretamente, das áreas protegidas. Portanto, é necessário que os governantes compreendam que a administração pública está em déficit com essas áreas, na medida em que desvalorizam e esvaziam o funcionamento do Sistema.
Para isso, precisamos planejar nossas ações. Concessões isoladas associadas ao já conhecido abandono e letargia do Estado não nos parece um caminho que permita comemorar o início desse processo de mudança comportamental.
Concordo plenamente com o posicionamento do CRF e com o comentário do Maurício Marinho. É isso aí! Tal medida seria salutar caso o Estado, a SEMA e a FF tivessem feito a lição de casa e houvesse um amplo debate nas UCs e seu entorno sobre a questão.
ResponderExcluirMais uma vez, parabéns ao CRF pela manifestação pública de questões vitais às Unidades de Conservação do Estado.
ResponderExcluirAcrescentaria o fato de que o PL 249/13 não foi devidamente discutido em cada UC, nos conselhos gestores e com os agentes e comunidades locais diretamente envolvidos, ainda mais nas unidades onde grande parte das atividades de uso público são mantidos por meio de parcerias. Nos últimos anos foram gastos milhões de reais (a exemplo do Projeto de Ecoturismo da Mata Atlântica) para a reforma e definição de estruturas de apoio ao uso público, estudos técnicos e capacitação, com o compromisso de envolver os atores locais e regionais nos sistemas de gestão dos núcleos. Mas independente desses compromisso o que presenciamos foi a desestruturação das UCs, por meio de uma política centralizadora e de sucateamento, na contramão dos preceitos internacionais da gestão das áreas protegidas. E é por isso que esse PL 249/13 acaba ser mais uma das ações equivocadas e que gerará desgaste e mais conflitos nos parques. Uma típica ação de gabinete, descompromissada do necessário reforço humano, financeiro e político das UCs e sem o respaldo de uma política de governança das áreas protegidas, na linha da cogestão adaptativa. Somente dessa forma poderão resgatados e validados os compromissos com os atores sociais diretamente envolvidos em cada UC, por meio da construção de acordos e medidas de cooperação de longo prazo, Não se trata de reserva de mercado, como alguns desavisados insistem em pregar, mas no reconhecimento de direitos e deveres básicos de cumprimento da missão das UCs. Do contrário, até as empresas com possível interesse em participarem de editais de concessão, cedo ou tarde perceberão a inviabilidade dos "negócios" em UCs.
.Precisamos. Sem duvida, Conceituar, questões pertinentes
ResponderExcluirFaltou a análise sobre a existência de diversas comunidades tradicionais que habitam atualmente territórios reconhecidos como UCs, como os indígenas, quilombolas, caiçaras, etc. que são constantemente alvo de ações restritivas e prejudiciais por parte do governo de estado. Essa proposta não obedece ao estabelecido pela convenção 169/OIT - que o país é signatário - sobre a necessidade da consulta livre, prévia e informada aos povos indígenas afetados por tal política. É autoritária, retrógrada e não atende a interesses públicos.
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